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Foto do escritorMonica Martinez

A arte de Yayoi Kusama: o poder da expressão criativa no enfrentamento de transtornos mentais


Autorretrato da artista plástica Yayoi Kusama
Autorretrato, 1950 - Yayoi Kusama - foto de Monica Martinez

Foi uma grande experiência ter visto a exposição "Yayoi Kusama - 1945 - hoje", na Fundação Serralves, no Porto, Portugal, em 6 de julho de 2024.


Confesso que, após vê-la, fiquei sem fôlego. Precisei sair um pouco do recinto para tomar ar e me reorganizar psiquicamente junto à natureza, tamanha é a intensidade da visão do conjunto de sua obra.


A imersão nas criações de Kusama é, de fato, uma experiência avassaladora, que nos leva a confrontar a nossa própria percepção da realidade, tal como a artista faz através de suas obras.


Essa intensidade está profundamente ligada à vida pessoal de Yayoi Kusama, uma das artistas mais influentes e reconhecidas do século XX, cuja carreira é marcada por uma estética vibrante, única e repetitiva, refletindo sua luta pessoal com transtornos mentais.


Nascida no Japão em 1929, desde jovem, Kusama enfrentou alucinações e pensamentos obsessivos, o que a levou a criar uma arte que tanto expressa quanto lida com suas angústias internas.


Seus padrões de pontos, redes e formas infinitas são mais do que simples elementos visuais; são manifestações tangíveis de suas percepções do mundo, onde a repetição atua como uma tentativa de ordenar o caos interno.


Os famosos "polka dots", ou bolinhas, que permeiam grande parte de sua obra, simbolizam, segundo a artista numa entrevista concedida ao jornal inglês The Guardian em 2010, uma conexão entre o micro e o macrocosmo, uma tentativa de se integrar ao universo e encontrar um lugar seguro dentro dele.


Esses pontos infinitos representam também as alucinações que Kusama experimenta, uma fusão entre o que é real e o que é imaginado. Sua arte, portanto, torna-se um campo de enfrentamento onde ela confronta suas alucinações, transformando o medo e a ansiedade em algo belo e ordenado.




Obra de arte com pontos de Yayoi Kusama
"Infinity Mirrors" permite experimentar o mundo interno de Yayoi

A série de obras "Infinity Mirrors" (ao lado) é um exemplo perfeito de como Kusama utiliza sua arte como uma forma de terapia. Os espelhos infinitos criam um ambiente onde os espectadores são levados a experimentar o espaço como ela o percebe internamente: vasto, repetitivo e sem limites. Para Kusama, essas instalações não são apenas experiências visuais; são uma extensão de seu estado mental. Ao criar essas obras, ela externaliza suas obsessões e medos, permitindo que outros entrem em seu mundo e, paradoxalmente, proporcionando a ela um senso de controle sobre sua própria realidade.





Kusama também utilizou sua arte como uma forma de se conectar com o mundo exterior, algo que sua condição mental dificultava. Ao invés de se isolar, ela escolheu se expressar através de suas criações, criando uma ponte entre sua mente e o público. Sua arte, muitas vezes grandiosa e imersiva, não apenas expressa sua visão do mundo, mas também convida os espectadores a partilhar de suas experiências e a refletir sobre a própria percepção e realidade. Esse diálogo com o público é, em muitos aspectos, uma forma de aliviar o isolamento que o transtorno mental pode trazer.


Além de ser um meio de expressão pessoal, a arte de Kusama também funcionou como uma espécie de âncora, oferecendo-lhe um sentido de propósito e identidade. Na entrevista, Kusama afirmou que a arte salvou sua vida. Durante décadas, ela se internou voluntariamente em uma clínica psiquiátrica no Japão, onde continuou a criar incessantemente. O ato de criar tornou-se uma rotina, uma prática constante que a ajudava a manter sua sanidade e a dar sentido à sua existência. Em suas palavras, a arte não era apenas uma paixão, mas uma necessidade vital, uma ferramenta para sobreviver ao sofrimento mental.


Desta forma, a obra de Yayoi Kusama não pode ser dissociada de sua luta pessoal contra o transtorno mental. Sua produção artística não é apenas um reflexo de suas percepções, mas uma ferramenta crucial para lidar com suas alucinações e obsessões. Kusama transformou sua condição em uma força criativa, usando a repetição, a obsessão e o infinito como formas de canalizar e ordenar sua realidade interna. Assim, sua arte não só contribuiu para o panorama artístico global, mas também se revelou essencial para sua própria sobrevivência e bem-estar psicológico, abrindo caminho para que outros possam fazer o mesmo.


Texto e fotos: Monica Martinez


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The Art of Yayoi Kusama: The Power of Creative Expression in Facing Mental Disorders


It was a great experience to have seen the exhibition 'Yayoi Kusama - 1945 to Today,' at the Serralves Foundation in Porto, Portugal, on July 6, 2024.


I confess that, after seeing it, I was left breathless. I had to step outside for a moment to get some fresh air and mentally regroup in nature, such is the intensity of the vision of her body of work.


The immersion in Kusama’s creations is, indeed, an overwhelming experience, one that leads us to confront our perception of reality, just as the artist does through her works.


This intensity is deeply connected to the personal life of Yayoi Kusama, one of the most renowned artists of the 20th century, whose career is marked by a vibrant, unique, and repetitive aesthetic that reflects her struggle with mental disorders.


Born in Japan in 1929, from a young age, Kusama faced hallucinations and obsessive thoughts, which led her to create art that both expresses and copes with her inner anguish.


Her patterns of dots, nets, and infinite forms are more than mere visual elements; they are tangible manifestations of her perceptions of the world, where repetition attempts to order the inner chaos.


The famous 'polka dots,' which permeate much of her work, symbolize, according to the artist in an interview with The Guardian in 2010, a connection between the micro and macrocosm—a way to integrate herself into the universe and find a safe place within it.


These infinite dots also represent the hallucinations Kusama experiences, a fusion of what is real and imagined. Her art, therefore, becomes a battleground where she confronts her hallucinations, transforming fear and anxiety into something beautiful and ordered.


The 'Infinity Mirrors' series (beside) is a perfect example of how Kusama uses her art as a form of therapy. The infinite mirrors create an environment where viewers are led to experience space as they perceive it internally: vast, repetitive, and without limits. For Kusama, these installations are not just visual experiences; but an extension of her mental state. By creating these works, she externalizes her obsessions and fears, allowing others to enter her world and, paradoxically, providing her with a sense of control over her reality.


Kusama also used her art to connect with the outside world, something that her mental condition made difficult. Instead of isolating herself, she expresses herself through her creations, building a bridge between her mind and the audience. Her art, often grand and immersive, expresses her view of the world and invites viewers to share her experiences and reflect on their perceptions and reality. This dialogue with the audience is, in many ways, a means of relieving the isolation that mental disorders can bring.


Beyond being a form of personal expression, Kusama’s art also served as an anchor, offering her a sense of purpose and identity. In the interview, Kusama stated that art saved her life. For decades, she voluntarily admitted herself to a psychiatric clinic in Japan, where she continued to create incessantly.


Creating became a routine, a constant practice that helped her maintain her sanity and give meaning to her existence. In her words, art was not just a passion but a vital necessity, a tool to survive mental suffering.


Text and photos: Monica Martinez



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